sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Contacto imediato de 3º grau com o espelho

Dona Mindinho concebeu-se em pensamentos de cabeça inadaptada a um mundo a preto e branco. Havia de surgir uma criatura que vivesse numa paleta mais completa, de preferência com mais dias em verde-limão do que cinzento-rato.
Aquela mulher adulta que a inventou nunca quis, nas horas de Mindinisse, ser um Peter Pan de unha vermelha e vestido, nem a avózinha meiga que cheira sempre a creme hidratante misturado com bolinho quente. Quis ser mais, não ter idade, ser plena, ou quase.
Dona Mindinho criou-se mesmo antes de nascer. Já conhecia o mundo, o mundo jamais a conheceu.
Escolheu o Dia dos Enganos para surgir. Passou de lado num espelho e sentiu-se corar. Uma paixão nascia dentro do peito. Aquela mulher do outro lado que sorria com deliciosa malícia era mesmo o que ela queria ser. Parecia-se tanto com ela, no entanto era mais firme, mais mulher, mais isto, mais aquilo. Ou talvez não. Aquela mulher só tinha um brilho nos olhos diferente. Conheceu-se assim, reconheceu aquele brilho como sendo o seu de há uns anos. O desmazelo, as derrotas e não conquistas levaram-no e já todos esperavam dela um olhar baço e que atende aos desejos e vontades de todos.
Em segredo, diante daquele espelho meio turvo das lágrimas por se sentir viva, fez nascer Dona Mindinho: uma mulher apaixonada por si e pela vida, nas horas vagas, uma heroína com TPM.

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